Compulsão alimentar e os neurônios envolvidos

Compulsão alimentar e os neurônios envolvidos

13 de março de 2023

Obesidade

A obesidade é uma pandemia global que está ligada ao desenvolvimento de muitas doenças. Além de algumas condições genéticas raras, a principal causa de obesidade no mundo hoje é o sedentarismo, dieta rica em alimentos gordurosos e açucarados e comportamento alimentar compulsivo (comer mesmo na ausência de fome).
As propriedades hedônicas dos alimentos altamente palatáveis (como gorduras e açúcares) aparência, cheiro, sabor conseguem manipular o balanço energético homeostático e os circuitos que regulam a saciedade; fazendo com que o indivíduo precise se alimentar mesmo na ausência de déficit energético.
Já sabemos que uma dieta composta por alimentos industrializados, com açúcares e gorduras em excesso, é a principal causa de obesidade. O que ainda não está bem compreendido é como o cérebro regula as preferências alimentares.
 

Neurônios IPAC

A amígdala cerebral, responsável por emoções poderosas como o medo, parece estar relacionada com o ato de comer demais. Em um experimento com animais, pesquisadores identificaram um grupo de neurônios na amígdala que leva os ratos a comerem mais alimentos gordurosos e açucarados, mesmo quando não estão mais com fome.
Assim como nós, os roedores avaliados no estudo também preferem alimentos altamente palatáveis, com gorduras e açúcares. E assim como nós, eles comem esses alimentos por prazer, e não apenas por sobrevivência.
Os neurônios em questão fazem parte uma estrutura chamada de núcleo intersticial do ramo posterior da comissura anterior (IPAC), que é uma das principais estruturas da amígdala. Os neurônios IPAC são ativados por estímulos gustativos inatos ou aprendidos e recebem projeções densas do córtex insular, um ponto ligado ao comportamento hedônico (relacionado ao prazer).
Um dos experimentos realizados consistiu em "desligar" esses neurônios. Como consequência, os animais não eram mais atraídos por alimentos gordurosos e açucarados como antes. Os animais contentaram-se em comer o necessário para se manterem saudáveis e bem alimentados.

Os dados iniciais do estudo apresentado mostraram que os neurônios da região IPAC são ativados por alimentos palatáveis e que eles são responsáveis, em parte, pelas preferências alimentares dos animais. Os cientistas também perceberam que, mesmo que o animal já esteja saciado, se esses neurônios ainda estiverem ativos, isso pode levar esses animais a continuarem comendo. Ou seja, a pesquisa conseguiu identificar um grupo único de neurônios extrahipotalâmicos cruciais na promoção de respostas metabólicas através da modificação do comportamento.
A redução da quantidade de alimento ingerida pelos animais teve como consequência a prevenção no ganho de peso, além de os animais tornaram-se mais ativos e propensos a atividade física (na roda de correr dentro das suas gaiolas), melhorando, consequentemente, a saúde metabólica.
Terapias direcionadas a esses neurônios podem ser uma estratégia interessante para o tratamento da obesidade, pois bloquear esse grupo de neurônios parece (1) levar à perda de peso a longo prazo, (2) ter efeitos benéficos na função metabólica e (3) proteger contra obesidade e síndromes metabólicas.
 

A partir dos dados obtidos nessa pesquisa, podemos afirmar, conceitualmente, que essa área do cérebro é um ponto de partida para melhor compreender o complexo circuito cérebro-metabolismo envolvido na regulação da homeostase energética e consequentemente, do peso corporal.
A equipe agora direciona seus esforços a compreender como manipular esses neurônios relacionados ao comportamento hedônico. Eles vão mapear como esses neurônios respondem a diferentes tipos de alimentos e quais os tornam mais sensíveis à ativação.
É assim que a ciência caminha!
 
Ref. Furlan, A., Corona, A., Boyle, S. et al. Neurotensin neurons in the extended amygdala control dietary choice and energy homeostasis. Nat Neurosci 25, 1470–1480 (2022). https://doi.org/10.1038/s41593-022-01178-3

Marissa G. Schamne
Marissa G. Schamne
PhD | Cientista

Pesquisadora e professora universitária, farmacêutica por formação. Despertou o interesse pela pesquisa durante a faculdade na Iniciação Científica, que obviamente foi na área da neuropsicofarmacologia. Concluída a graduação, segue o caminho da carreira acadêmica e pesquisa até a co-fundação do Rigor Científico – onde encontrou uma maneira de expressar todo seu amor pela Ciência, e vislumbra a possibilidade de levar essas informações ao maior número possível de pessoas. Era uma pessoa tímida que conforme foi se inserindo no meio acadêmico encontrou uma forma de libertar-se dessa timidez, e agora matraqueia sem parar. Apaixonada pela natureza, esportes ao ar livre e a sensação de liberdade que isso traz. Gosta de viajar pelo mundo, seja através dos livros que lê ou das viagens que faz. Almeja alçar vôos mais altos divulgando ciência por aí.

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